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domingo, 7 de agosto de 2011

A NOVA GEOPOLÍTICA

Com orçamento militar recorde, EUA adotam unilateralismo e se posicionam para a nova fase da competição econômica global

Petróleo e terror movem poderio bélico

Em linha de guerra ao terror e com suas ambições geopolíticas, o governo George W. Bush promoveu a maior reorganização e modernização das tropas militares americanas dos últimos 50 anos. No início do seu governo, Bush prometeu manter a força militar americana ""acima de todos os desafios, tornando qualquer corrida armamentista de tempos passados totalmente inútil".

Depois do 11 de Setembro, Bush anunciou que essa mesma força "acima de todos os desafios" se arrogava o direito de atacar outros países preventivamente, caso se sentisse intimidada.

O governo Bush vê o ""resultado positivo" dessa ameaça no ditador líbio, Muammar Gaddafi, que abandonou seu programa de armas e decidiu abrir o país a investimentos americanos. Mas lá onde realmente mora o perigo, segundo os EUA, tal política provocou apenas o efeito inverso.
No mundo árabe, líderes que possam parecer alinhados com os EUA tornaram-se ainda mais impopulares como resultado da invasão americana no Iraque.

Nos outros dois integrantes do chamado ""eixo do mal" (Coréia do Norte e Irã), a mensagem dos "ataques preventivos" pode ter levado a uma aceleração também "preventiva" de projetos nucleares capitaneados por seus líderes.

Como reforço à atual política, tanto Bush quanto John Kerry afirmaram na campanha eleitoral que os EUA não se submeterão a nenhuma instituição internacional para tomar medidas bélicas que considerem necessárias.

O descaso com a ONU e com a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) é exacerbado ainda por orçamentos militares recordes no governo Bush e por uma movimentação de tropas pelo mundo ainda não totalmente compreendida. O resultado é que todo um conjunto de alianças militares construídas ao longo dos últimos 50 anos estremeceu nos anos Bush. A magra coalizão militar no Iraque é a prova disso.

Há pouco mais de duas semanas, os EUA aprovaram um novo orçamento militar de US$ 422 bilhões para 2005, visando a modernização e o deslocamento de suas tropas pelo globo. Como Bush, Kerry promete manter os investimentos militares nos mesmos níveis atuais, aumentar em cerca de 40 mil homens a força ativa e continuar a atual reorganização.

Nos últimos dois anos, cerca de 70 mil militares americanos estacionados em bases tradicionais na Europa, Ásia e Arábia Saudita começaram a ser transferidos para atender às novas diretrizes.

Geopoliticamente, ganharam predominância na Ásia e ao sul da China países como Filipinas, Malásia e Cingapura; na África e a oeste da Arábia Saudita, o minúsculo africano Djibuti; e ao sul da Rússia e oeste da China, o Cazaquistão e o Uzbequistão, próximos às reservas petrolíferas do mar Cáspio. No centro do Oriente Médio, os EUA têm outros 120 mil homens no Iraque, além de 18 mil no Afeganistão. Entre os dois países, está o Irã. Logo abaixo, o pequeno Qatar também vem recebendo novos contingentes.

Michael O'Hanlon, analista do Instituto Brookings, afirma que a justificativa da guerra ao terror facilitou o deslocamento das tropas americanas para todas essas regiões, que atendem, na verdade, a objetivos geopolíticos.

Além de terroristas, os EUA estariam perseguindo a manutenção e a estabilidade de reservas, principalmente de petróleo, para uma nova fase, já em andamento, da competição econômica global.

Em 2004, por exemplo, 40% do aumento da demanda mundial por petróleo terá como origem a China, segundo dados do FMI. Em dez anos, os chineses poderão estar totalmente dependentes do petróleo da Arábia Saudita e da região do mar Cáspio.

Para Kenneth Pollack, ex-membro do Conselho Nacional de Segurança e especialista em Oriente Médio, os EUA crêem ter ""legítimo interesse" na região. A razão seria o fato de toda a economia mundial e americana estar baseada em petróleo barato. O fato de um litro de gasolina custar nos EUA menos do que em um país pobre como o Brasil (R$ 1,56 contra R$ 2,14) é um exemplo disso. ""O fato de os EUA não importarem a maior parte do seu óleo da Arábia Saudita é irrelevante", diz Pollack, já que problemas de fornecimento no país teriam impacto global nos preços. ""Daí a preocupação em assegurar a região."

Cerca de 25% do petróleo consumido hoje no mundo sai do Golfo Pérsico, sendo 15% da Arábia Saudita. Além de ter as maiores reservas, o país produz seu petróleo a 30% do custo do da Rússia, por exemplo. De seu comércio com a África, no ano passado, 85% das importações dos EUA foram em petróleo. As exportações tiveram percentual semelhante em máquinas para extração do óleo.

FERNANDO CANZIAN
Folha de São Paulo, 24 de outubro de 2004


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